Maioria dos pastores formados em Teologia no país não possuem reconhecimento do MEC. Em seu famoso tratado Política, o filósofo e educador grego Aristóteles (384 - 322 a.C.) defende de forma aguerrida a participação  do Estado na educação. Para ele, o governo é o “Educador supremo”. Nos  séculos que se seguiram ao fundador do Liceu, quando o  helenismo tornou-se o cânon de gostos, estéticas e pensamentos, esse  conceito reinou soberano entre os povos ocidentais. Porém, pouco mais de  trezentos anos após a morte do sábio, o Verbo fez-se carne e, como  homem, repudiou qualquer interseção entre sua missão messiânica e o  governo temporal ao afirmar que seu Reino não era deste mundo. Com isso,  criou um abismo entre seus seguidores e a máquina estatal. Embora, ao  longo dos dois mil anos seguintes, tenha havido muitas tentativas de  envolver duas instâncias tão díspares – a Igreja e o Estado –, a maioria  delas redundou em desastre. Não é de se estranhar, portanto, que hoje  os estudantes brasileiros de teologia cristã estejam no meio de um fogo  cruzado entre os acadêmicos que defendem o reconhecimento estatal de  cursos da área e aqueles que entendem que a educação acerca das coisas  de Deus deve ficar restrita ao âmbito missional, isenta da influência  dos césares de plantão.                                                  
Desde que o Ministério da Educação (MEC), através do Conselho Federal  de Educação, passou a reconhecer o caráter universitário do curso de  teologia, em 1999, a possibilidade de ter a vocação premiada com um  diploma carimbado pelo governo tem feito muitos estudantes suspirarem. O  assunto foi tema da reportagem Excelência é a meta, publicada  na última edição de CRISTIANISMO HOJE, a primeira desta série sobre o  ensino teológico no país. O sentimento é mais que natural – afinal,  grande parte dos alunos vislumbra, de posse do canudo,  prosseguir estudos que venham a guindar sua carreira, dentro ou fora do  ambiente eclesiástico. “Concluindo a graduação, tenho a intenção de  fazer mestrado e doutorado, e o reconhecimento do MEC me facilitaria  muito o processo”, planeja José Mirabeau, membro da Igreja Presbiteriana  de Copacabana, no Rio de Janeiro. Ele está no 4º ano do curso de  bacharel em teologia do Seminário Teológico Presbiteriano Reverendo Ashbel Green  Simonton. Aspirante ao ministério pastoral, Mirabeau espera que o curso  lhe ofereça a formação acadêmica necessária ao exercício da atividade,  já que, em sua denominação, a graduação teológica é uma exigência para  isso.
Por outro lado, em igrejas onde tal formação não é caminho obrigatório  para o púlpito, a visão ainda parece ser mais missional. “O conhecimento  teológico é fundamental, mas não será por meio do reconhecimento junto  ao MEC que teremos verdadeiros ministros do Evangelho”, pondera a  estudante Priscila de Carvalho Figueiredo, aluna do Instituto Bíblico da  Assembleia de Deus na Ilha do Governador (Ibadig), também no Rio. “Ser  pastor não é uma profissão, mas um chamado, uma vocação”. No seu caso, o  estudo da teologia não visa a obtenção de diploma de terceiro grau, já  que é farmacêutica. Mas sua fala toca num tema delicado, epicentro da  preocupação de muitos envolvidos na questão: a motivação financeira. No  entender de Priscila, é um erro classificar o pastorado como uma maneira  de adquirir riquezas.
“X da questão” – Se, para boa parte dos estudantes, o  reconhecimento do curso como de nível superior abre portas até então  impensáveis para graduados em teologia – como a continuidade dos estudos  nos níveis de mestrado e doutorado e a possibilidade de acesso a cargos  públicos restritos a portadores de diplomas de terceiro grau –, o corpo  docente vê a questão sob outra ótica. Para professores como Lourenço  Stélio Rega, diretor da Faculdade Teológica Batista de São Paulo, a  oficialização da disciplina interfere até no perfil dos alunos. Segundo  ele, antes dificilmente alguém procurava cursos teológicos com outro  objetivo que não fosse atender a uma vocação: “Atribuo isso talvez à  oficialização do curso, pois antes era comum aconselhar um jovem a fazer  primeiro uma faculdade oficializada. Hoje, não há mais necessidade”.  Rega diz que agora, mesmo entre os que se dizem vocacionados, a média de  idade tem se alterado. “Temos mais alunos jovens”, aponta.
Fato é que quem se matricula hoje em um curso de teologia tem  procurado qualidade e perspectivas. “O aluno quer tudo recheado com um  diploma superior, reconhecido pelo MEC”, salienta o pastor presbiteriano  Jorge Henrique Barro, diretor da Faculdade Teológica Sul Americana de  Londrina (PR). “Ele já vislumbra uma especialização, e alguns voam alto,  pensando em mestrado e doutorado. Já aprenderam que estudar em uma  escola não reconhecida é a morte prematura de um sonho, pois não sendo  portadores de um diploma superior, seu curso será livre e ele não irá  adiante no processo contínuo de sua formação. Esse é um problema que as  escolas não reconhecidas terão de resolver”, diagnostica.
“Precisamos da ingerência direta do MEC para alcançar a excelência?”,  questiona, por sua vez, o pastor Neander Kraul, diretor do Seminário  Teológico Betel, no Rio de Janeiro. Para ele, a oficialização da  teologia ameaça o caráter essencialmente ministerial do pastorado. “Ao  nivelarmos pura e simplesmente essa área de formação com as demais,  passamos a admitir a teologia como campo profissional”, avalia o  educador (ver debate em quadro). “O MEC não é empecilho para  nenhuma instituição, a não ser para aquelas que levam a educação  teológica com a barriga”, discorda Robinson Jacintho de Souza, gestor e  coordenador acadêmico do seminário teológico Servo de Cristo. “Muitas  instituições continuam como seminários e, mesmo oferecendo cursos  livres, possuem e atendem ao rigor pedagógico-educacional”.
Mesmo assim, Jacintho defende que levar o ensino da teologia a sério,  em termos profissionais, não significa perder de vista o que chama de  razão da existência dos seminários teológicos: “Responder ao  comissionamento de Cristo por meio da educação. Fruto disso, de uns  poucos seminários e das faculdades teológicas reconhecidas, são os  ministérios frutíferos de seus ex-alunos, que mostram que o ‘x’ da  questão não está no MEC, mas em nós mesmos, como gestores desse  processo”, conclui.
Sim e não
Entre os entusiastas da oficialização, o professor Jorge Henrique  Barro, avaliador para cursos de teologia do Instituto Nacional de  Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep), destaca-se por  defender que quem ganha com o processo são os seminários, seus alunos e  as igrejas. Já uma das vozes críticas mais representativas é a do pastor  e professor Neander Kraul, diretor do prestigiado Seminário Teológico  Betel, no Rio. Neste debate, cada um deles expõe seus argumentos: 
CRISTIANISMO HOJE – Qual sua opinião sobre o reconhecimento do curso de Teologia como de nível superior?
JORGE HENRIQUE BARRO – Esse processo traz muitos  benefícios. A oficialização melhora as condições técnicas do curso, como  o projeto pedagógico, o plano de desenvolvimento institucional, o nível  do corpo docente, a biblioteca, o corpo técnico-administrativo e o  próprio corpo discente. Uma escola que passa por esse teste certamente  cresce e se desenvolve com mais consciência educacional. Passa a ser uma  escola dirigida por gente mais preparada para inseri-la no contexto  federativo de ensino.
NEANDER KRAUL – As evidências dão conta de que a  Igreja praticamente nada ganhou com o reconhecimento, se o objetivo  último dos seminários ao ofertar cursos de teologia for o de servir a  Igreja. O curso de Teologia era tido como campo especificamente  confessional, gozando de status diferenciado em relação às  demais formações de nível superior. Ao nivelarmos pura e simplesmente  essa área de formação com as demais, passamos a admitir a teologia como  campo profissional e derrubamos nosso antigo discurso de que pastores  não são profissionais. Além disso, todo conselho normatizador e  fiscalizador de profissão representa os braços do Estado e da própria  sociedade civil no controle de determinada ocupação.
Existe o risco de ingerência do MEC, ou seja, do Estado, sobre assuntos religiosos?
BARRO – As pessoas ligadas à educação teológica precisam ser mais  coerentes. O que se percebe é que os comentários sobre uma suposta  ingerência do MEC revelam, por um lado, muita ignorância no assunto, por  parte de gente que nunca leu os pareceres e portarias relativas ao  ensino da teologia. E, em segundo lugar, trata-se de uma justificativa  barata para não entrar nesse processo junto ao MEC. O Parecer CNE/CES 241/1999  garante o estabelecimento de composição curricular livre, levando em  consideração suas tradições religiosas. Então, quem disse que uma escola  reconhecida pelo MEC não pode ter uma ênfase ministerial? Nenhuma  escola precisa ter medo da ingerência sobre seus currículos ou sua  vocação.
KRAUL – Cresce, visivelmente, a ingerência do Estado no âmbito  religioso. É óbvio que progressivamente o controle sobre a Igreja se  adensará. Numa perspectiva espiritual, é fácil observar que todos os  prognósticos de que a fé e a religião se esvaziariam na virada do século  foram derrubados. Convivemos hoje num mundo sensorial com alta  tecnologia, muita espiritualidade e muito misticismo. Neste contexto,  parece que a ação diabólica é legitimar a religião na sociedade como um  conjunto de valores que simplesmente ajuda o homem a viver.
Qual o principal efeito desse processo de oficialização?
BARRO – Uma formação com mais qualidade. Ao reconhecer a área de  teologia, o MEC a coloca no sistema nacional e federativo – a teologia  sai da clandestinidade e passa a ser um curso com referência nacional.
KRAUL – A questão fundamental que levanto é de cunho ideológico,  considerando nossa realidade histórica. Muitos argumentavam que a  educação teológica brasileira precisava aprimorar-se. Concordo. O fulcro  da questão, entretanto, é se precisamos da ingerência direta do MEC  para alcançar esse objetivo.
Em busca da qualidade 
Conheça algumas das escolas que já obtiveram o reconhecimento do MEC para seus cursos de teologia:
Escola Superior de Teologia – EST
Faculdade Batista de Minas Gerais – FBMG
Faculdade Batista do Rio de Janeiro – Fabat
Faculdade Batista Brasileira – FBB
Centro Universitário Metodista Bennett
Faculdade de Ciências, Educação e Teologia do Norte do Brasil – Faceten
Faculdade de Teologia de Boa Vista – Fatebov
Faculdade de Teologia de São Paulo da Igreja Presbiteriana Independente do Brasil
Faculdade de Teologia e Ciências Humanas – Fatech
Faculdade de Teologia Evangélica em Curitiba – Fatev
Faculdade Evangélica de São Paulo
Faculdade Evangélica de Tecnologia, Ciências e Biotecnologia da CGADB – Faecad
Faculdade Evangélica de Teologia de Belo Horizonte – Fate BH
Faculdade Evangélica do Piauí – Faepi
Faculdade João Calvino – FJC
Faculdade Luterana de Teologia – FLT
Faculdade Metodista de Teologia e Ciências Humanas da Amazônia – Fateo
Faculdade Nazarena do Brasil – FNB
Faculdade Teológica Batista de São Paulo – FTBSP
Faculdade Teológica Batista do Paraná – FTBP
Faculdade Unida de Vitória
Faculdade Teológica Sul Americana – FTSA
Universidade Luterana do Brasil – Ulbra
Universidade Metodista de São Paulo - Umesp
Centro Universitário Adventista de São Paulo – Unasp
Seminário Adventista Latino-Americano de Teologia – Salt

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